Rubenio Marcelo
É membro efetivo ocupante da Cadeira 35 da Academia Sul-Mato Grossense de Letras, da qual foi secretário-geral e atualmente é diretor cultural. É membro correspondente da Academia Mato-Grossense de Letras. Poeta, escritor e compositor, possui treze livros publicados (3 em coautorias) e três CDs – uma de suas obras mais recentes: o livro Vias do Infinito Ser (poemas) está indicado para o Vestibular 2021 da UFMS.
SINA E TEMPO
este mesmo instante
de agora
[em que pardais gorjeiam minhas retinas]
este mesmo milésimo de segundo
baterá amanhã
no mesmo instante imutável...
– e eu
neste mesmo pulso da rotina
mirarei gorjeios?
há pássaros que nos visitam
a cada insaciável instante
a cada respiração da volúpia do tempo
na trança de um renascer
em pendões de liberdade
nas plumas de lampejos
que aninham horizontes...
ante guilhotinas de anseios
que murmuram aos ouvidos das manhãs
no folheio das horas
há sóis e nuvens
sempre
convidando retinas... a sós.
ELEGIA AO PANTANAL
Ou grandes senões... labaredas
No compasso do hostil mormaço
línguas vorazes
incandescentes
tisnam com lambidas encarnadas
as onduladas cortinas
e os verdes mantos suspensos
cravados em léguas sem réguas
de múltiplos mapas que desafiam horizontes...
línguas vorazes
sedimentando tristezas
lambendo arredores
ardendo dores
na planície assustada,
no chão sangrado,
nos rios, nos sangradouros, nas baías e corixos,
nos campos e moitas,
nos bichos acuados,
nas matas e cerrados e nas plantas
em espasmos chamuscados de revoltas...
línguas vorazes
clareiras e lareiras
assinaladas por cortes a ferro e fogo,
chaminés de cifras sem licença prévia
tostando ares e hectares...
engolindo pontes
cortando os pulsos da aurora
sucumbindo o azul dos voos e cantos alados
à revelia da razão,
tendo as vísceras da inclemência como guia...
línguas vorazes
com cascos e trotes de fúria
em colos de arrobas traiçoeiras
e alqueires de torcicolos ruminados em fornalhas
semeando focos de vertigens de toda laia
na carona dos ventos cifrados
em penúrias e gulas
intimando os arvoredos, viveiros e ninhais...
ah, línguas pungentes,
transpirações de lavas dos cânticos finais,
fagulhas de ímpetos corrosivos
mirando a cumeeira da piúva pantaneira:
onde a morada dos tuiuiús
era messe convidativa para sonhos inexplorados...
agora... apenas um vazio
um soluço adormecido... à míngua...
a flama nua... sem fama
a aridez insepulta
numa penumbra
implume... impune!