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Olga Maria Castrillon-Mendes 

É professora e pesquisadora da literatura brasileira. Autora de Taunay viajante: construção imagética de Mato Grosso (Cuiabá: EdUFMT; Cáceres: EdUNEMAT, 2013); Discurso de constituição da fronteira de Mato Grosso www.unemat.br/editora, 2017 e Matogrossismo: questionamentos em percursos identitários (Carlini & Caniato, 2020).

PATINANDO SOBRE GELO FINO 

Diante da fragilidade e transitoriedade do contemporâneo, Zigmunt Bauman tem a expressão que soa artística, mas cruelmente. Ao patinar em gelo fino o que evita a queda/afogamento é a velocidade. A velocidade ganhou estatuto de valor de sobrevivência. Mas, o que pode a reflexão perante a velocidade? Para uns, afasta os pensamentos a serem maturados; para outros, é condição essencial. Muitos produzem no caos, impensável em muitos casos. O que dizer, então, do pensamento que demanda pausa e descanso, exame dos fatos e tranquilidade (ou imprudência) de tê-los alcançado? Ao lado do pensar, é preciso problematizar. E como chegar à elaboração de um problema, se não se aprendeu a pensar sobre as questões oriundas desses mesmos problemas? 
Sem refutar as ideias de Bauman, de extremo valor conceitual para se compreender o contemporâneo, fico com a impressão da necessidade de cadenciar o tempo, mesmo que na contramão da fluidez. Ambas as configurações coexistem como os lados de uma mesma moeda. Crianças se expõem a variados focos de informação: o celular, o som, a imagem, as aulas virtuais. Mudam de canal em segundos e dão conta (ou não) das tarefas, mesmo que estas estejam retomando o automatismo do livro didático. Parece estarrecedor a evidencia de certo retrocesso. Enquanto essas crianças patinam sobre o gelo fino, há os que ficam no desafio da pedagogia, do conhecimento para imediata utilização (e consequente eliminação) como os que são produzidos pelos programas de software, considerados mais palatáveis e atraentes. Certamente, as imagens geradas pela máquina mantém por mais tempo a atenção, mas nem por isso asseguram a autoinstrução. O resultado é o descompasso entre as gerações e os consequentes conflitos nas relações de aprendizagem. Muitos pais estão exaustos, saudosos do que sempre combateram: “A escola não ensina, mas eu também não dei conta”. Na falta de respostas no próprio tempo, patinar sobre o gelo fino é fatal para as fragilidades diante da “nova” realidade porosa, mas que pode ser tomada como inexorável destino. 
Entre o anterior fenômeno da solidez histórica e a “modernidade líquida” de produção fugaz e maleável, as dificuldades têm sido enormes para conciliar o universo do conhecimento. Para dar conta do fenômeno social é preciso repensar os dogmas que soavam como promessa de coragem para enfrentamento do mundo, mas que soam estranhos para as crianças e os jovens de hoje.

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