

Joaquim Cesário de Mello
É psicólogo, psicoterapeuta e professor universitário. Em meados dos anos 1980 participou do Movimento de Escritores Independentes e foi colunista da Vida Crônica (1998 – 2002) do encarte JC Cultural do Jornal do Commercio (PE) e é autor do blog Literalmente. Escritor e poeta, participou de várias antologias literárias, entre elas Nouveaux Brésils Fin de Sciècle (2000), Poesia Viva do Recife (CEPE, 1996) e Cronistas de Pernambuco (Carpe Diem, 2010), Poesia na Escola (SP, 2022). Pós-graduado em Pedagogia (UOE/PE) e com Mestrado em Psicologia Social e da Personalidade (PUC/RS). Autor dos livros Dialética Terapeuta (Litoral, 2003), A Alma Humana (Labrador, 2018), A Psicologia nos Ditados Populares (Labrador, 2020), A Vida Como Um Espanto (Labrador, 2022), No Cemitério das Nuvens (Folheando, 2022)
AUTORRETRATO
Pinto com a língua dos dedos
esculpindo letras no granito alvo dos papéis
Canto com a mudez dos vocábulos escritos
bailando no intervalo das palavras
e nos espaços permitidos das vírgulas
Fotografo imagens, lembranças e afetos
com o olhar buliçoso da alma
salpicada de assombros e espantamentos
Interpreto minhas personas desnudadas
no tirar das máscaras e de seus ocultamentos
no descortinar dos véus e das mantilhas
dos meus vários outros acobertamentos
Componho sinfonias surdas
com as caligrafias inclinadas dos ventos
enquanto rabisco desenhos com linhas
nem sempre geométricas do tempo
No respingar colorido do preto e branco
retrato paisagens que por mim passam
talhando-me de fendas e sulcos
como uma tatuagem a me revelar inteiro
Nas paredes do tempo
em que vivo, choro, sorrio e vagueio
vou revestindo meus sentimentos
com trechos e versos descrevendo
as crônicas dos meus fartos
e inesgotados pensamentos
EPÍLOGO
Ainda não me cheguei à derradeira hora
nem ao instante que me for findo
Ainda não fechei por último as pálpebras
nem ao sono em que não mais acordarei
Ainda não acabou meu espanto
nem encerrei agendas e expedientes
Ainda não interrompi os passos
nem há mapas no resto da estrada
Ainda não esgotei meus respiros
nem sei quando será o fatal suspiro
Ainda não me despedi daqui
nem minhas lembranças sumiram
E até quando a cortina não fechar
nas trilhas que os passos me levam
vou derramando versos pelo chão