Francis Kurkievicz
É poeta, escritor e professor de Filosofia e Criação Literária, natural de Paranaguá/Brasil. Publicou, em dezembro de 2020, pela Editora Patuá, o livro de poemas B869.1 k96. Têm poemas publicados nas Revistas Acrobata, Hiedra, Mallarmatgens, Arara, Estrofe – traduções nas Revistas Zunái, Escamandro, Letra & Fel. Em 2022 teve seus poemas publicados nas duas maiores antologias mundiais de poesia: World Poetry Tree, organizado por Adel Khosan – Dubai/EAU; e Living Anthology of Writers of the World, organizado por Margarita Al – Moscou/Rússia.
De frente para o leste, percebo
apenas o silêncio da brisa oceânica
e esta luz que dá sombras ao olhar.
[Ruídos roídos
rumor de humores
gritos de ritos
me despertam, chamam, invocam!].
Mas tenho medo de dar as costas para este mar e este sol.
Tenho medo de volver o corpo
e encarar este horizonte em desalinho.
Nada sei de picos e aclives
de súbitas subidas
trilhas entrincheiradas
entre escarpas e fissuras rochosas.
[A verticalidade da existência me espanta!]
O sol ao meio-dia nos iguala
: humanos, animais, vegetais, minerais
Substância somos da mesma natureza
do mesmo íntimo e único espaço.
[Ruídos e rumores!].
Mas não há mais como ignorar
: os semelhantes se convocam
a confraria se aglutina
buscam o mesmo ar rarefeito.
Giro o olhar ao norte
numa distração dissimulada.
As narinas distinguem os odores da floresta
que se insinuam
na maresia da brisa marinha.
O sol declina.
Põe coroa nos cumes.
E direção no olhar.
[Humores e ritos!].
Giro o corpo num ásana preguiçoso
e me detenho no contrário.
E temendo não ceder mais aos meus temores
miro, de corpo inteiro, a trilha dourada
que o crepúsculo baixa.
E numa intuição serpentina e luciférica
me pergunto espantado
: será este o meu caminho?
Nunca estive confortável
nesta pele, neste tempo;
nunca estive conformado
neste desenho, nesta fronteira;
quase sempre, nunca estive estável;
ausente, fora do limite sempre;
como uma tangente com urgência
de outras curvas e pontos de fuga;
estive à deriva – Derrida
focando Foucault afogado
deletando Deleuze deludido
guardando-me de Guattari
: nunca estive convosco
à beira do cais e de outras companhias
prefiro os gérmens dos germanos
a fraqueza dos francos
[ou o latim crioulo dos latinos];
estive não estando
Estado mínimo
estagiando estradas
outros ínfimos, outros estádios
outrora auroras boreais;
nunca estive comportado, comportando
contornando contrastes e Adornos
e Benjamins e Marcuses e marquises;
contendo acasos e opacos
consentindo finitos estive
contemplando ocasos ociosos ou não;
estando conteúdo
não posso estar em mim;
estando em mim, contudo e portanto,
porto outros tudo e tantos.