Daniel Zarpelon Leão
É um poeta desquitado. Tecnólogo em Monitoramento Ambiental, Bacharel em Ciência da Computação, Mestre em Planejamento Urbano, sua formação intelectual e científica vigora no passeio, dentre os litígios desumanos e inexatos. Joga-se ao mar da poesia em 1994, quando publica, pelo Instituto Estadual do Livro do Rio Grande do Sul, “Da raiz que pari falas...”. Depois, outros textos seus chegaram à praia. Ora, em adesivos vidrados de ônibus porto-alegrenses; ora, numa Antologia Poética de escritores portugueses, além-mar. Neste exato agora, a Pixé mantém seu naufrágio.
TRAVESSA CABRAL
O espelho mostra o que tens em corpo – machuca
permite a visão do próprio peito – palpita
como a viela sem nome em que nasceu
espaço onde teu ovo
solto cutuca
Certa é a entrega
a expectante medida
do sujeito nela contida
Dor não se espera – não se guarda para a saliva
gravidade é vanguarda – é força cuspida
coisa fora da casca
que salta
incerta enquanto vida
Na última casa da viela, havia sim, uma tapera.
mas não podias entrar... lhe faltava a lembrança do que era
a própria terra
onde nada fez ainda
onde nada agora alcança
(sequer a saudade do barro que não tinha)
Quem lhe dera um pisador para limpar os pés
para dormir aquilo que carrega
para acordar – depois da gema bebida
Quem lhe dera encontrar uma lança
perdida
ao lado da casa que teve medo de entrar – e ela temia
Ver-se enquanto reflexo, exige tinta
Ver-se numa rua sem saída, exige esquina
Há nome à placa
um aviso para o local
o logradouro não rima
sequer o alcance logra ou atina
Resta a suposição
da vontade precipitada
que nunca descansa
em meio à queda
um forte desejo de vidro
Quiçá, de espelho