Isaac Ramos
Poeta e crítico literário. Nascido em Tabatinga-AM. Reside em Mato Grosso desde 1998. Graduado em Letras (UFMS), em Aquidauana-MS. Mestre e Doutor em Estudos Comparados de Literaturas de Língua Portuguesa (USP). Professor da Universidade do Estado de Mato Grosso há 22 anos. Docente do Programa de Pós-Graduação em Estudos Literários da UNEMAT. Atualmente coordena a pesquisa “Signos e significados na poética engajada e religioso de D. Pedro Casaldáliga”, com apoio da FAPEMAT. Publicou A metáfora do olhar: Alberto Caeiro e Manoel de Barros (2018) (crítica literária, em fase de lançamento); Teias e teares (2014), Festa de Letras (1997), Astro por rastro (1988), Reflexões (1984) (poemas). Membro da ALB (Academia de Letras do Brasil – seção Amazonas) e ABEPPA (Associação Brasileira de Escritores e Poetas Pan-amazônicos), em Manaus-AM.
PARA QUEM (NÃO) TEM ASAS
O poema (não) deve ter
A graça de uma garça
A sutileza de um tuiuiú
O voo de um par de araras
A atenção de um bando de periquitos
A troca de roupa de uma lagartixa
Os contornos de um caracol
A ligeireza de uma lagartixa
A espera do pulo de onça
A correção de formigas em uma casa
A fazer limpeza no texto morada
Um olhar atento no livro
Um link aberto na tela
Um like, um comentário e um print
Sem que as metáforas assustem
Mas que busque o significado
Dentro de si e desvende seus enigmas
E, sobretudo, se embebede nas imensidões da poesia
Porque a vida não é andar em círculos
Mas é bom se perder nos labirintos
Da palavra poética e que siga
Os contornos das formas retas
E que a ilucidez do poema
Trespasse as metáforas
Perdidas no encontro do infinito
E, finalmente, os voos se tornem necessários
Caso não tenha um pouco disso tudo
Melhor viver do nada
E ser um náufrago da existência
Porque poesia é para quem (não) tem asas.
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Sede mata
(Não) (pro)ceda
Ao amor
(Des)conversa
Se (não) for poesia.
SEM HORA PARA A LUA
Lua, metáfora em luz,
Musa birrenta de poetas clássicos.
Acreditas que ainda causas encantos?...
Não consegues mais arrumar casamento.
Nem com dotes.
Nem o sol lhe aguenta.
Quando enorme, a gema inteira
Não cabe em si.
Não vale a pena em qualquer lente.
Fresca, atrevida, permissiva,
Foi-se o tempo em que eras margarida.
Hoje sequer baixas guarida.
Outrora metáfora aurífera,
Hoje pingente de souvenir.
Não adianta.
Os apaixonados suicidaram-se
No século dezenove.
A magia acabou.
Não mais existe o casto,
Mas permanece o incesto
E, acredite, o incerto.
Lua, metáfora atrevida,
Cata teu brilho e vá brilhar em outro lugar!
As pessoas aqui são volúveis.
As mulheres ainda são musas,
Só que de Instagram, Facebook e WhatsApp.
Os rapazes antes finos.
Agora fitness. Descansam o cérebro
E celebram os músculos nas academias.
(Não de letras, é claro!).
Anda!... Não há likes pra ti.
Há para debates infindos,
Para abates e massageio de egos,
Para a santa ignorância,
Para o pouco verbo.
Ninguém mais escreve cartas.
Ninguém telefona para ouvir a voz do outro.
Ninguém visita para dar um abraço,
Tomar um café ou beber um vinho.
Apenas conectam-se, mutuamente.