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Icleia Rodrigues de Lima

É graduada em Letras pela UFGO (1968), Mestra em Filosofia da Educação, pela FGV-RJ (1981) e Doutora em Educação, pela USP-FEUSP (1992). Foi professora do Curso de Graduação em Letras da UFMT, nos Programas de Mestrado em Educação da UFMT e da UEL-Londrina-PR, e também no Programa de Mestrado em Estudos de Cultura Contemporânea (ECCO-IL-UFMT).

PRA DIZER O CONTEMPORÂNEO

Foi nos prolegômenos de sua História da Literatura Brasileira que Massaud Moisés apontou um entrave nas pesquisas acerca de escritores e escritos do lado de cá do Atlântico. É um entrave para além do teórico, metodológico e prático. MM dizia que é dificultoso refletir sobre a vida literária brasileira pensando uma organização que separe em períodos e fases, escolas e tendências, os atos e fatos havidos, desde a Carta de Caminha até o presente. O autor pôs em pé de igualdade Gregório de Matos e Luiz de Camões, afirmando que são nítidas as semelhanças entre um e outro. Mostrou que não há dissemelhanças tão importantes assim entre a literatura barroquista de Gregório de Matos, no século XVII e a literatura  antropofagista de Oswald de Andrade, no século XX. Massaud ousou mais, ao dizer que nossos românticos parnasianos avizinharam-se de Portugal tanto quanto Gregório de Matos e que Vicente de Carvalho, Alphonsus de Guimaraens e Cecília Meireles “se equiparam mais aos líricos portugueses que aos brasileiros”.


A mais bela audácia de MM, entretanto, foi no dizer que períodos, fases, escolas e tendências se interpenetram e se imbricam à maneira de manchas de óleo num oceano. Ora, metáforas tem outras serventias além de se imiscuírem verso e prosa na feitura da poesia. Metáforas servem também de heurística ou ferramenta para apreender-se um objeto de conhecimento e chegar-se a uma determinada lógica que o explique. Perguntam-me aqui, na Revista Pixé, o que é o contemporâneo na Literatura Brasileira. A metáfora da mancha de óleo continua válida para a literatura e para qualquer arte: o contemporâneo é aquilo que o artista e o fruidor (incluindo aí o crítico) dizem que o contemporâneo é...


As imagens da artista plástica Mató colorem esse número de Pixé e remetem ao contemporâneo. E o que é o “Contemporâneo” na pena de Pia Tedesco? É o que lembra a metrópole do presente, os sinais horizontais e verticais de trânsito, a construção civil, o inchaço demográfico e o empilhamento humano das periferias, os sinaleiros com as cores rubras de sangue, de desastre e dos perigosdo atual e do quotidiano... Mas também lembra escadarias, a escada de Cortázar que é uma metáfora, outra boa metáfora para pensar a chegada (ou subida?), a insuficiente precisão do preciso das escolas ou fases da literatura e das artes em geral. Daí que a metáfora que subjaz nas faixas na pintura de Pia Tedesco e nos acessos e desvios de sua obra, serve ao que cabe aqui para dizer o que é o Contemporâneo.


O Contemporâneo, depois dos sonetos de Gregório de Matos, da chuva dos cajus de Dom Aquino, do manifesto de Oswald de Andrade, da pedra no caminho de Carlos Drummond de Andrade, da poemática maquínica de Dias-Pino, dos rasqueados de Moisés Martins, do livro-recital Dona de Luciene Carvalho, do chip binário do homem virtualizado de Eduardo Mahon, chega-se um tempo, agora sim, mais que nunca, em que a vida literária, os autores e suas obras se organizam em tendências, manchas de óleo que se mesclam, se cingem, se untam, mas quase sempre cabe em Klaxon e Pixé. Cabe Babu-78 e Mató Pia Tedesco. 


O Contemporâneo é uma harmonia conflitual de todas as tribos que produzem e distribuem literatura e arte. Autores perambulam e se tribalizam entre grupalidades diversas para dizer o literário. O literário está dizendo em outras linguagens que não só nas patentes, o literário escreve uma gramática emergente, sincrética e eclética, outras linguagens além do próprio literário. O Contemporâneo acaba aqui de ser pensado como  um tempo temporão, um literário que não é mais só de papel...


Finalmente consegui,


Tornei-me a mulher que sempre,


Sempre persegui!

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